Brasil: casos de Covid-19 podem ser sete vezes maiores do que números oficiais

Estudo foi coordenado pela Universidade Federal de Pelotas (Ufpel) e recebeu aporte financeiro de R$ 12 milhões do Ministério da Saúde

Subnotificação é um dos grandes problemas da doença no Brasil
Foto: GlobalStock/GettyImages/CreativeCommons
Subnotificação é um dos grandes problemas da doença no Brasil

O número de casos de Covid-19 no Brasil subiu para 374.898. Já o de mortes, chegou a 23.473 . Somente nas últimas 24 horas, foram contabilizados 11.687 novos infectados e 807 óbitos. Por si só, os dados divulgados pelo Ministério da Saúde já impressionam. Mas a realidade pode ser ainda mais marcante. Um estudo nacional realizado para estimar a porcentagem da população contaminada pelo novo coronavírus (Sars-CoV-2) e o tamanho da subnotificação aponta que o contágio nas ruas pode ser até sete vezes maior que o oficial.

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O estudo é coordenado pela Universidade Federal de Pelotas (Ufpel) e financiado pelo Ministério da Saúde, que disponibilizou R$ 12 milhões para sua realização. Em 133 cidades, pesquisadores foram as ruas para coletar o sangue da população e fazer um rápido questionário.

Ao todo, foram 25.025 pessoas entrevistadas. Das 133 cidades visitadas, em 90 delas foram realizados 200 testes ou mais. Estes municípios correspondem a 25,6% da população nacional, totalizando 54,2 milhões de pessoas. O estudo estima que até 760 mil estão ou já foram infectadas. É cerca de sete vezes mais do que as 104.782 notificações somadas nestes locais em 13 de maio, um dia antes dos pesquisadores irem às ruas.

Os próprios pesquisadores, contudo, pedem que os dados destes 90 municípios não sejam tomados como base para o restante do país. Segundo eles, o mais importante é mostrar o nível de prevalência e de subnotificação em cada região. Neste sentido, é na Norte onde os dados são mais preocupantes.

Das 15 cidades com maior índice de prevalência, 11 são da Região Norte. Em Breves (PA), que ocupa o topo deste ranking, cerca de um quarto da população pode já ter sido infectada pelo novo coronavírus.

Localizado na Ilha de Marajó, o município é apenas o 17º mais populoso do Pará, com 102,7 mil habitantes. Dos 250 testes realizados no local, 24,8% deram positivo. Levando este percentual para a população total da cidade, equivale a dizer que 25.600 pessoas podem já ter tido contato com o coronavírus. Este número é 87 vezes maior do que o de notificações do dia 13 de maio.

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Em Castanhal, também no Pará. A subnotificação também é gritante. De acordo com a pesquisa, 15% da população pode já ter sido contaminada. Em números reais, trata-se de mais de 30 mil pessoas. Em 13 de maior, no entanto, eram 271 casos notificados. Ou seja: a contaminação pode ser até 111 vezes maior do que a identificada pelas autoridades.

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Castanhal é a terceira cidade com maior índice de prevalência segundo o levantamento. Entre ela e Breves, está Tefé (AM), com uma possibilidade de até 19,6% da população já ter sido contaminada. As capitais Belém, com 15,1%, Manaus (12,5%) e Macapá (9,7%) completam o topo desta lista que joga os holofotes para o Norte do país.

"As diferenças observadas entre as cidades confirmam duas coisas. Primeiro, que há várias epidemias em diferentes estágios no Brasil. Segundo, que a Região Norte tem o cenário epidemiológico mais preocupante do país hoje", atesta o epidemiologista Pedro Hallal, reitor da Ufpel.

Um olhar sobre as dez capitais com maior prevalência ajuda a compreender o quão diferente é a situação em cada parte do país. A comparação entre os números oficiais em 13 de maio (obtidos através de consulta a base de dados Brasil.io) e os apontados pela pesquisa mostra uma diferença menor em Recife, Maceió e Vitória do que nas demais. Nas capitais capixaba e alagoana, por exemplo, a taxa de notificação é de 20,85% e de 19,08%, respectivamente. Já em Belém ela é de apenas 2,52%. Uma diferença que pode ser atribuída principalmente à limitação de testagem.

"No Brasil nós não fomos capazes de expandir significativamente nossa capacidade de testagem. Embora alguns estados tenham ampliado, nacionalmente você não teve iniciativas coordenadas. Com isso os números continuam claramente subnotificados", comenta Fernando Bozza, chefe do Laboratório de Medicina Intensiva do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas, da Fiocruz, e coordenador de pesquisa do Instituto D’Or.

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As subnotificações se revelam um problema em diversas frentes. Elas prejudicam a implementação de uma política de saúde mais eficaz no combate à Covid-19, pois tornam mais difícil traçar um retrato fiel de cada estado e ainda dificultam o trabalho de quem busca prever o comportamento da doença no país.

"Sem saber a real notificação é impossível fazer uma previsão e apontar quando vai ser o pico da doença", exemplifica Wesley Cota pesquisador da Universidade Federal de Viçosa, que trabalha com monitoramento de casos de Covid-19.

Dificuldades

As 133 cidades visitadas foram escolhidas por serem consideradas satélites das regiões administrativas do IBGE. Em cada um dos municípios, foram sorteados os setores censitários (também estabelecidos pelo IBGE), que contam com 300 residências cada um. As casas e os moradores também foram escolhidos por sorteio, numa escolha que deixa o universo examinado quase que totalmente definido pela aleatoriedade.

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O planejamento era de que, somente nesta primeira etapa, 33.250 pessoas fossem testadas. No entanto, dificuldades impostas pelas prefeituras de alguns municípios impediram que esta meta fosse atingida. Por isso, 43 cidades não tiveram o resultado divulgado. Ao todo, a pesquisa será realizada em três rodadas, com um intervalo de duas semanas entre cada uma.