'Achei que meu filho estivesse morto', diz mãe de bebê dopado em creche de SP

Exame toxicológico detectou o medicamento clonazepam, conhecido como Rivotril, em menino que passou mal em creche de Votuporanga; entenda

Foto: Google Street View
Caso aconteceu na creche de nome Centro Municipal de Educação Infantil (Cemei) Valter Peresi, em Votuporanga (SP)

Mesmo após passar quatro dias no hospital acompanhando o filho internado, em maio de 2017, Natália (nome fictício) não conseguiu descobrir o que tinha deixado a criança de apenas seis meses tão mal. Os exames de ultrassom, ecocardiograma e tomografia foram insuficientes para explicar os sintomas de Rafael (nome fictício), como vômitos e desmaios repentinos. Por fim, ela ouviu do médico: "Alguma coisa aconteceu na escola e não te contaram".

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Natália voltou ao Centro Municipal de Educação Infantil (Cemei) Valter Peresi, em Votuporanga (SP), a creche onde Rafael estava matriculado, mas nenhum dos funcionários soube explicar o que havia ocorrido. Era a quarta vez que o menino passava pelo mesmo problema. Depois de mudar o filho de creche, o menino não sofreu mais os sintomas de estar dopado .

"Quando peguei ele na escola, saí feito uma doida. Ele parecia que ia morrer. O bracinho dele estava caído, pendurado. Não sabia como socorrer ele. Já tinha acontecido quatro vezes, eu estava desesperada", afirma Natália.

Assim como o filho de Natália, outras crianças vinham sofrendo o mesmo problema na creche de Votuporanga . Só descobriu-se o que realmente estava acontecendo ali em novembro do ano passado, quando saiu o resultado do exame feito em outra criança. Após ver o filho passando mal, Keli Antoniolo resolveu investigar mais a fundo.

E descobriu: o filho dela - um bebê de meses - estava sendo medicado com clonazepan, comercializado pelo nome de Rivotril . Análises laboratoriais identificaram presença da droga no sangue e na urina da criança. O clonazepam é utilizado para inibir crises convulsivas, transtornos de ansiedade e de humor, síndromes psicóticas e outros tipos de tratamento, segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

A partir daí, outras mães pediram exames em seus filhos.

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"Em um mês aconteceu duas vezes com o meu bebê. Peguei meu filho desmaiado na creche , levei para casa, ele não respondeu, então nós corremos para a Santa Casa. Ele continuava sem reação. Achei que ele estivesse morto", diz Fernanda Silva Oliveira, de 33 anos, mãe de Nicolas, que também passou mal na mesma escola.

Nicolas, de apenas seis meses, ficou dois dias na semi-UTI. Fernanda afirma que não pensou em levá-lo para fazer o exame toxicológico porque não imaginou que algum funcionário da creche pudesse dopar seu filho para fazê-lo dormir.

"Isso é um absurdo que poderia ter acabado com a vida de uma dessas crianças. Nós iremos acompanhar o caso até o final para garantir que ninguém saia impune dessa história e para que a justiça seja feita de forma que alivie a angústia dessas mães", declara Bruna Nunes Carvalho, advogada responsável pelo caso.

Ao menos seis crianças apresentaram sintomas

Além de Fernanda, Keli e Natália, ela atende outros seis pais cujos filhos apresentaram os mesmos sintomas na creche Valter Peresi.

O exame toxicológico foi feito apenas no filho de Keli. Mas como todos os sintomas são idênticos, segundo a advogada, entende-se que todas elas ingeriram a mesma substância. Os primeiros relatos são de 2016, e somente com o boletim de ocorrência, no fim do ano passado, é que as famílias tomaram conhecimento dos outros casos e decidiram se juntar.

A Prefeitura de Votuporanga abriu uma sindicância para apurar o ocorrido. Segundo portaria publicada no Diário Oficial da cidade, "a medida é necessária por considerar a gravidade das denúncias e a necessidade de apuração de possível cometimento de falta funcional por servidores públicos". A Prefeitura informa que os profissionais da educação sabem que nenhum medicamento deve ser administrado nas escolas municipais sem consentimento dos pais.

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"A Prefeitura abriu sindicância, só que a pessoa continua trabalhando e exercendo o mesmo cargo, cuidando das mesmas crianças", diz Fernanda. Agora, ela e outros pais vão acompanhar o inquérito policial. A prefeitura de Votuponga e a creche Valter Peresi ainda não se manifestaram.