Após dez anos, ninguém foi punido pelo acidente da TAM em São Paulo

Avião que vinha de Porto Alegre bateu em um prédio da própria companhia ao tentar pousar no aeroporto de Congonhas; 199 pessoas morreram

Acidente com o Airbus A320 da TAM ocorreu no dia 17 de julho de 2007 no aeroporto de Congonhas, em São Paulo
Foto: Arquivo
Acidente com o Airbus A320 da TAM ocorreu no dia 17 de julho de 2007 no aeroporto de Congonhas, em São Paulo

Após quase dez anos, ninguém foi condenado pelo acidente com o Airbus A320 da TAM, ocorrido em 17 de julho de 2007. Ao longo desse período, todos os denunciados pelo MPF (Ministério Público Federal) foram absolvidos após julgamento em primeira e segunda instância.

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A investigação foi conduzida por três órgãos. Um deles, o Cenipa, da Aeronáutica, que concluiu que uma série de fatores contribuíram para o acidente . O relatório constatou, entre vários pontos, que os pilotos movimentaram, sem perceber, um dos manetes para a posição idle (ponto morto) e deixaram o outro em posição climb (subir). O sistema de computadores da aeronave entendeu que os pilotos queriam arremeter – termo utilizado para quando o piloto aborta o pouso e volta a ganhar altitude.

O documento relata que não havia aviso sonoro para advertir os pilotos sobre falha no posicionamento dos manetes e que o treinamento deles era falho: a formação teórica, pelo que se apurou na época, usava apenas cursos interativos em computador. Outro problema apontado é que o copiloto, embora tivesse grande experiência, tinha poucas horas de voo em aviões do modelo A320, e que não foi normatizada, na época, a proibição em Congonhas de pousos com o reverso (freio aerodinâmico) inoperante, o que impediria a aterrisagem nessas condições em situação de pista molhada.

A Latam – empresa resultante da fusão entre TAM e a chilena LAN – negou que houvesse falhas no treinamento. Segundo a companhia, tanto o treinamento quanto os procedimentos dos pilotos são feitos conforme padrões mundiais de segurança e norteados pelos manuais do fabricante e aprovados pelas autoridades do país de origem e órgãos reguladores.

O Cenipa, entretanto, não é um órgão de punição, mas de prevenção. Ele não aponta culpados, mas as causas da tragédia. O relatório, portanto, dá informações e 83 recomendações para que situações como essa não se repitam. O relatório feito pela Aeronáutica contribuiu para outras duas investigações, feitas pela Polícia Civil e pela Polícia Federal, que levaram a conclusões bem diferentes sobre os culpados.

O caso foi investigado inicialmente pela Polícia Civil, que decidiu indiciar dez pessoas, entre funcionários da Infraero (Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária), da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) e da TAM. Após o indiciamento, o processo foi levado ao promotor Mário Luiz Sarrubbo, do Ministério Público Estadual, que incluiu mais um nome e denunciou 11 pessoas. Segundo ele, a ocorrência “poderia e deveria” ter sido evitada.

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Em nota, a Infraero informou que “não falhou”. “Restou comprovado, pelo Cenipa, que não houve falha do administrador na liberação da pista. As conclusões dispostas no referido documento não apontam a pista como fator contribuinte”, diz o órgão. A empresa disse que chegou a prestar esclarecimentos à Justiça e que, no decorrer da ação, foi excluída do processo.

A denúncia do promotor não foi levada à Justiça estadual. O processo foi remetido ao Ministério Público Federal porque, no entendimento dele, o caso se tratava de crime de atentado contra a segurança do transporte aéreo, competência federal.

“Em dado momento, na nossa investigação, detectamos que havia muitas questões envolvendo a empresa aérea, o nível de segurança, erros em cadeia que resultaram nos erros fatais cometidos na cabine e, evidentemente, uma sequência anterior envolvendo a empresa, a Anac, a Infraero”, disse Sarrubbo.

Por se tratar de ocorrência aérea, o caso também foi investigado pela Polícia Federal, que finalizou sua investigação decidindo culpar apenas os pilotos, Kleyber Lima e Henrique Stefanini Di Sacco. O inquérito se transformou em denúncia e, nesse documento, que foi aceito pela Justiça, o procurador Rodrigo de Grandis decidiu denunciar três pessoas.

Justiça Federal

A ex-diretora da Anac Denise Abreu, o então vice-presidente de operações da TAM, Alberto Farjeman, e o diretor de Segurança de Voo da empresa na época, Marco Aurélio dos Santos de Miranda e Castro foram denunciados por “atentado contra a segurança de transporte aéreo”, na modalidade culposa. Eles foram absolvidos pela Justiça de primeira instância e também pelo Tribunal Regional Federal.

Os três foram julgados pelo juiz Márcio Assad Guardia, da 8ª Vara Federal Criminal de São Paulo que, em 2015, absolveu-os. Para o juiz, eles não agiram com dolo (intenção).

“[Eles] não praticaram o crime de exposição de aeronave a perigo previsto no Artigo 261 e do Código Penal, seja porque as condutas a eles atribuídas não correspondem à figura típica abstratamente prevista na norma [ausência de subsunção do fato ao tipo], seja porque não se encontram no desdobramento causal – normativo ou naturalístico – do resultado”, diz o juiz na sentença. “De acordo com as premissas apresentadas pelo órgão acusatório [MPF], seria possível imputar a responsabilidade penal pelo sinistro ocorrido em 17 de julho de 2007 a um contingente imensurável de indivíduos, notadamente pela quantidade e pelo grau de desvirtuamento apresentados no curso do processo”. No mês passado, o TRF manteve a decisão de primeira instância e a absolvição dos réus.

Histórico

No dia 17 de julho de 2007, o Airbus da TAM que vinha de Porto Alegre tentou pousar em Congonhas. A pista estava molhada e, por causa de reforma recente, não tinha grooving (ranhuras, que facilitam a frenagem).

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O avião atravessou a pista, passou sobre a Avenida Washington Luís e bateu num prédio de cargas da própria companhia. O acidente provocou a morte de 199 pessoas.


* Com informações da Agência Brasil