Gisèle Pelicot diante do tribunal de Avignon, sul da França, em 16 de dezembro de 2024
CLEMENT MAHOUDEAU
Gisèle Pelicot diante do tribunal de Avignon, sul da França, em 16 de dezembro de 2024
Clément Mahoudeau

A Justiça da França anunciou nesta quinta-feira (19) a pena máxima de 20 anos de prisão a Dominique Pelicot por drogar durante uma década sua então esposa Gisèle  para estuprá-la ao lado de dezenas de desconhecidos, no último ato de um julgamento histórico.

"Senhor Pelicot, em relação ao conjunto dos fatos, o declaramos culpado de estupro com agravantes", declarou o presidente do tribunal de Avignon, Roger Arata.

O réu de 72 anos , que recebeu o veredicto de culpa de pé e sem expressar qualquer emoção, nunca negou ter drogado Gisèle com ansiolíticos entre 2011 e 2020 para que ela dormisse e conseguir estuprá-la ao lado de homens desconhecidos que ele contactou pela internet.

Na quarta-feira, a advogada de Dominique, Béatric Zavarro , ainda esperava que o tribunal "se afastasse" um pouco da pena máxima e considerasse os "traumas" que seu cliente sofreu durante a infância, incluindo um estupro aos 9 anos.

Além do principal réu, o tribunal declarou culpados os outros 50 acusados - um deles à revelia -, apesar de cerca de 30 deles terem solicitado a absolvição por acreditarem que foram "manipulados" pelo "monstro" Dominique Pelicot.

O grupo recebeu penas de entre três anos de prisão - um de cumprimento obrigatório - e 20 anos contra os 51 acusados no grande julgamento por estupros em série, que chamou a atenção do mundo.

A Promotoria havia solicitado entre 10 e 18 anos de prisão para 49 deles, e quatro anos para o único "processado por toques" em Gisèle Pelicot.

Os pedidos de penas foram mais rigorosos que a condenação média por estupro na França, que foi de 11,1 anos em 2022, segundo o Ministério da Justiça.

Natal na prisão

Antes da leitura do veredicto, o coletivo feminista Amazonas de Avignon , no sul da França, colou cartazes ao redor do tribunal com as frases: "Natal na prisão, Páscoa atrás das grades" e "A vergonha mudou de lado".

"O estupro afeta as mulheres em todo o mundo. É por isso que todos os olhos estão voltados para o que acontecerá", explicou à AFP uma representante do movimento.

A pressão era grande sobre os cinco juízes do tribunal de Avignon que julgaram entre 2 de setembro e 16 de dezembro os 51 homens com idades entre de 27 e 74 anos, e com perfis sociais diversos.

A decisão do tribunal foi acompanhada de perto na França e também no exterior, onde o julgamento e sua vítima Gisèle Pelicot se tornaram um símbolo das agressões sexuais contra as mulheres.

Profissionais de 180 veículos de comunicação - 86 estrangeiros - foram credenciados para acompanhar a leitura do veredicto, mas apenas quatro - entre eles a AFP - tiveram acesso à sala principal do tribunal. Os demais jornalistas permaneceram em salas de transmissão anexas.

Fora do comum por sua duração, pelo número de acusados e, sobretudo, pela atrocidade dos fatos denunciados, o julgamento já entrou para a história.

Laure Chabaud, uma das representantes do Ministério Público, deseja que a decisão do tribunal vá além do destino dos acusados, envie "uma mensagem de esperança às vítimas de violência sexual" e sirva para concretizar uma "mudança" na sociedade.

As associações feministas também esperam que o julgamento mude a atitude das pessoas em relação ao estupro, tentativa de estupro e agressão sexual, denunciados na França por mais de 200.000 mulheres a cada ano.

O caso também ajudou a personificar o flagelo das vítimas de agressão sexual, em particular por meio do uso da submissão química, na figura de Gisèle Pelicot , que deixou de ser uma vítima anônima e virou um ícone feminista que exortou as mulheres a "não permanecerem em silêncio" para que "a vergonha mude de lado".

"Obrigado Gisèle", afirma uma faixa pendurada no centro histórico de Avignon, diante do tribunal.

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