JULIEN DE ROSA
Donald Trump não assumirá o cargo antes de 20 de janeiro, mas, no cenário mundial, já atua como se fosse o presidente dos Estados Unidos.
O republicano está estampando seu carimbo na diplomacia americana, pelo menos nas crises de Síria e Ucrânia.
Os líderes mundiais fazem fila para falar com ele, que foi tratado como convidado de honra na grande reabertura da Catedral de Notre Dame, em Paris, no fim de semana.
O presidente em fim de mandato, o democrata Joe Biden, de 82 anos, esteve ausente na cerimônia e sua presença vai se apagando.
"Não é surpreendente em absoluto que Trump busque já começar a desempenhar o papel de presidente na sombra", disse à AFP Colin Clarke, diretor de pesquisa na consultoria de segurança The Soufan Group. "E nem sequer acho que seja inapropriado neste momento."
Trump enfrenta uma situação internacional mais volátil que durante o seu primeiro mandato.
"O mundo parece estar um pouco louco neste momento", disse Trump quando se reuniu com o presidente francês, Emmanuel Macron, no sábado, em sua primeira viagem ao exterior desde as eleições de 5 de novembro.
- 'Incomum' -
Trump, que se orgulha de ser não intervencionista, diz ter a intenção de manter os Estados Unidos fora de guerras no Oriente Médio e defende a redução da ajuda americana a Kiev.
Quando o ex-presidente sírio, Bashar al Assad, cambaleava no sábado, Trump afirmou em sua rede Truth Social que os Estados Unidos "não deveriam se envolver", apesar de manterem centenas de tropas no norte do país.
Mas a queda repentina de Assad pelas mãos de rebeldes liderados por islamistas complicará seu desejo de ignorar esta região.
Por enquanto, ele tenta tirar proveito.
No domingo, estimou que a Rússia havia abandonado seu aliado Assad porque está concentrada na guerra na Ucrânia, e é "a hora de agir" para Vladimir Putin e buscar um cessar-fogo com Kiev.
Em outra frente, Trump, que prometeu firme apoio a Israel, advertiu que os militantes de Gaza vão pagar um preço alto se não tiverem libertado os reféns até ele assumir o cargo.
Essas posições são comuns para Trump, que tem o costume de revelar suas políticas através das redes sociais.
No início deste mês, utilizou uma série de publicações noturnas na Truth Social para anunciar sua intenção de impor tarifas a México, Canadá e China se estes não contiverem o que ele chamou de fluxo de migrantes e drogas para os Estados Unidos.
"Suas recentes declarações e ações sobre a política externa dos Estados Unidos podem ser incomuns em comparação com outros presidentes americanos em transição para a posse, mas são completamente coerentes com o seu próprio comportamento passado", explicou Brian Finucane, assessor do International Crisis Group.
- 'Avançar' -
A presidência na sombra de Trump é ainda mais potente porque os líderes estrangeiros veem cada vez mais o envelhecido Biden como "basicamente inexistente", disse Clarke.
"A maioria dos líderes mundiais está preparada para avançar e começar a pensar em como lidar com uma nova administração Trump", acrescentou.
Entre eles está o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelensky, que, apesar de temer que Trump possa empurrar a Ucrânia para um acordo que resulte em perda de território para a Rússia, se reuniu com o presidente eleito dos Estados Unidos em Paris.
Isso cria uma situação delicada para Biden, que tenta reforçar seu legado em política externa diante do homem que uma vez classificou de ameaça para a democracia.
O democrata em fim de mandato impulsionou a ajuda militar à Ucrânia em seus últimos meses e atribuiu para si, em parte, a queda de Assad e o acordo de cessar-fogo no Líbano.
Mas Trump herdará de Biden um dos desafios de política externa mais espinhosos de todos os presidentes em décadas.
"Isso faz parte de ser presidente [...] Ele não é apenas o presidente nos momentos bons, mas também nos momentos difíceis", concluiu Clarke.