Mulheres indianas sofrem assédio e intimidação por parte de homens que usam câmeras e drones em teoria destinados a vigiar a fauna selvagem, segundo alertaram pesquisadores nesta segunda-feira (25).
Trishant Simlai, da Universidade de Cambridge, interrogou 270 mulheres que vivem perto da reserva de tigres de Corbett, no norte da Índia.
O exemplo mais alarmante foi a divulgação nas redes sociais, por alguns agentes florestais, de uma foto de uma mulher com autismo fazendo suas necessidades na floresta.
Para as mulheres dos povoados da região, essa floresta representa um espaço de "liberdade e expressão", à margem dos homens nessa "sociedade muito conservadora e patriarcal", explica Simlai à AFP.
Lá elas podem cantar, falar sobre questões tabu, como sexualidade, ou beber álcool e fumar enquanto colhem ervas e lenha para suas lareiras.
Mas a instalação de câmeras e gravadores ou o uso de drones para rastrear e proteger os tigres, elefantes e outros animais que vivem na área teve um “impacto desproporcional” sobre essas mulheres, diz o pesquisador.
Às vezes, as mulheres têm de buscar refúgio porque os drones são deliberadamente lançados sobre suas cabeças, de acordo com o estudo publicado na revista Environment and Planning F.
A pesquisa também relata o caso de um guarda florestal que flagrou um casal no meio de um “caso” graças a uma das câmeras instaladas e “alertou imediatamente a polícia”.
Uma mulher entrevistada para o estudo explica que esses dispositivos inibem seu comportamento “por medo de ser fotografada ou gravada no momento errado”.
O uso indevido dessa tecnologia pode até se tornar contraproducente para o objetivo teórico de controlar a vida selvagem ameaçada.
Depois que a fotografia da mulher autista se tornou viral, os homens de seu vilarejo “quebraram e atearam fogo” em todas as câmeras que encontraram, explica um deles.
- Entre o homem e o tigre -
Para evitar essas câmeras, as mulheres vão mais fundo na floresta, que tem uma das populações de tigres mais densas do mundo. Elas também cantam menos para evitar avisar os felinos de sua presença.
Uma delas, que explicou que o medo das câmeras a levou a se aventurar em áreas remotas da floresta, foi morta por um ataque de tigre este ano, diz Simlai.
Ocasionalmente, esses sistemas beneficiaram as mulheres. O relatório explica o caso de uma mulher que “toda vez que o marido batia nela, ela corria para ficar na frente da câmera para que ele não a seguisse”.
Embora essas técnicas de monitoramento ambiental tenham um efeito positivo na conservação da vida selvagem, Simlai acredita que é necessário informar e envolver as comunidades locais em seu uso.
Rosaleen Duffy, especialista em ecologia da Universidade de Sheffield, no Reino Unido, explica que, “infelizmente”, não está surpresa com o conteúdo do relatório.
“O que me surpreende é que os ambientalistas pensem que a tecnologia pode ser introduzida em um vácuo social, político e econômico”, diz ela à AFP.
Ela pede regras claras sobre o que pode e o que não pode ser feito com essas ferramentas “e consequências claras para aqueles que as utilizam de forma inadequada”.