Os ataques aumentaram nos últimos anos, tanto nas redes sociais da fundação, como no memorial de Buchenwald
JENS SCHLUETER
Os ataques aumentaram nos últimos anos, tanto nas redes sociais da fundação, como no memorial de Buchenwald
JENS SCHLUETER

As ameaças de morte não surpreendem mais o diretor do memorial do campo de concentração de Buchenwald. Mas com a vitória inédita da extrema direita alemã nas eleições regionais, ele se prepara para dias ainda mais difíceis.

"Meus amigos e eu estamos chateados e deprimidos desde a noite de domingo", declarou à AFP Jens-Christian Wagner, diretor da fundação que administra a área que abrigava o campo nazista.

A região da Turíngia, onde fica o campo, deu a vitória ao partido Alternativa para a Alemanha (AfD) nas eleições de domingo. Pela primeira vez, a bancada da extrema direita será a maior no Parlamento deste pequeno "land" no leste da Alemanha.

“As opiniões direcionadas contra o nosso memorial serão reforçadas e ficará mais difícil mudar a opinião das pessoas", afirma Wagner.

O líder da AfD na Turíngia é um ex-professor de História, Björn Höcke, e uma das figuras mais radicais do partido, que defende o fim da cultura de arrependimento a respeito dos crimes dos nazistas, um legado do pós-guerra indiscutível por muitos anos.

Em 2017, ele chamou o Memorial do Holocausto em Berlim de "monumento da vergonha".

- Ameaças de morte -

Em 2025, a fundação vai comemorar o 80º aniversário da libertação do campo de Buchenwald, o primeiro em que as tropas americanas entraram, no dia 11 de abril de 1945.

"Talvez nada aconteça como o planejado. Talvez tenhamos que reinstalar uma delegacia de polícia", como acontecem na década de 1990, devido às ações de grupos neonazistas, afirma o historiador.

Jens-Christian Wagner recebeu quatro ameaças de morte recentemente, em reposta a uma carta enviada a 350.000 habitantes da Turíngia para tentar convencê-los a não votar na AfD.

Os ataques aumentaram nos últimos anos, tanto nas redes sociais da fundação, "inundadas de conteúdos revisionistas", como no próprio memorial.

Árvores plantadas em memória dos sobreviventes foram derrubadas e suásticas foram colocadas no local.

Repleto de provocações antissemitas, o livro de visitas foi retirado do memorial.

Os responsáveis pelos atos de vandalismo "são idiotas sem motivação política e não representam a AfD", disse o aposentado Uwe Baumann, 63 anos, que visitou o local com amigos húngaros.

O homem, "horrorizado" com os crimes nazistas, atravessa uma vasta planície cercada por arame farpado perto do antigo crematório.

Entre 1937 e 1945, quase 56.000 pessoas morreram em Buchenwald. Entre as vítimas estavam milhares de judeus, mas também ciganos, opositores do regime de Hitler, homossexuais ou prisioneiros da União Soviética.

"A AfD é vista como uma ovelha negra, mas não tem problemas com o passado nazista", disse Baumann.

- Contra-atacar o relato -

Jens-Christian Wagner discorda: "A AfD não se contenta em minimizar os crimes nazistas, mas também divulga referências positivas do nazismo".

Por exemplo, Björn Höcke incluiu uma canção do poeta Franz Langheinrich, um dos idealizadores da política cultural nazista na década de 1930, em seu programa eleitoral, disse Wagner.

Este ano, a Justiça multou duas vezes o líder político por ter usado o slogan de um grupo paramilitar nazista em seus comícios.

"Ao relativizar a Shoah, Björn Höcke também nega os fundamentos da democracia alemã”, disse Lorenz Blumenthaler, da Fundação Amadeu Antonio.

A cultura da memória da Alemanha "não foi imposta pelo governo, vem da sociedade civil", destacou o porta-voz da ONG que luta contra a extrema direita.

"Há forças políticas que, hoje, voltam a questionar (os crimes nazistas), os relativizam ou minimizam. Estamos profundamente envergonhados", afirmou na segunda-feira o presidente alemão, Frank-Walter Steinmeier.

Na Turíngia, os demais partidos se recusaram a estabelecer uma aliança com a AfD para formar um governo.

Mas a extrema direita também pode ter influência no financiamento do memorial de Buchenwald, que é bancado em 50% pelo governo regional, teme Wagner.

Para contra-atacar "a hegemonia cultural" do partido, o centro quer reforçar sua presença nas redes sociais e cogita investir no TikTok.

Esta plataforma está saturada pela AfD e pela desinformação, "mas alguns influenciadores explicam muito bem aos mais jovens o trabalho de memória", afirma Blumenthaler.

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