
Montchavin, uma vila nos Alpes franceses conhecida por suas estações de esqui, tornou-se foco de um estudo médico após a identificação de um número inesperadamente alto de casos de Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA).
A doença, que afeta cerca de duas a três pessoas a cada 100 mil anualmente, foi diagnosticada em pelo menos 14 moradores dessa pequena comunidade de poucas centenas de habitantes .
O fenômeno chamou a atenção da neurologista Emmeline Lagrange , do Hospital Universitário de Grenoble , que desde 2009 investiga possíveis fatores ambientais que poderiam estar associados ao problema.

A descoberta dos casos e a busca por padrões
O alerta inicial veio quando Lagrange diagnosticou uma instrutora de esqui polonesa com ELA .
Ao relatar o caso à médica local, descobriu que não era um episódio isolado: outras três pessoas da vila já haviam sido afetadas. A partir de então, novos casos surgiram nos anos seguintes, totalizando 16 diagnósticos confirmados.
O que intrigou ainda mais os pesquisadores foi o fato de que nenhum dos pacientes apresentava histórico familiar da doença ou predisposição genética.
Diante disso, Lagrange e sua equipe analisaram diferentes fatores ambientais , como a qualidade da água, a presença de substâncias tóxicas no solo e a exposição ao gás radônio.
Nenhum desses elementos, no entanto, apresentou uma correlação definitiva com os casos da doença .
Ligação com o consumo de cogumelos venenosos
Em 2017, a investigação ganhou um novo rumo quando os pesquisadores notaram que seis dos pacientes costumavam consumir cogumelos locais.
Isso os levou a comparar a situação de Montchavin com casos registrados na ilha de Guam , onde, no final da Segunda Guerra Mundial , ocorreu uma epidemia de doenças neurológicas associada à ingestão de sementes de cícadas , conhecidas por conter substâncias neurotóxicas .
Os pesquisadores identificaram que os pacientes de ELA na vila francesa consumiam morillas falsas ( Gyromitra esculenta ), um tipo de cogumelo silvestre altamente tóxico e cuja venda é proibida na França .
Muitos deles acreditavam que esses cogumelos tinham propriedades rejuvenescedoras.
A relação entre o consumo dessas morillas e a incidência da doença se tornou o foco principal das investigações.
Debate entre especialistas
A pesquisa foi publicada em 2021 no Journal of the Neurological Sciences , destacando que a ingestão repetida desses cogumelos pode ser o principal fator de risco para o desenvolvimento da ELA na região.
Contudo, a comunidade científica ainda debate a hipótese. Alguns especialistas, como o neurocientista Jeffrey D. Rothstein , da Universidade Johns Hopkins , acreditam que os casos podem ser uma coincidência estatística.
Já outros pesquisadores, como a epidemiologista Evelyn Talbott , da Universidade de Pittsburgh , consideram o estudo relevante e digno de mais aprofundamento.
Embora ainda não haja uma resposta definitiva, o caso de Montchavin levanta novas questões sobre a relação entre fatores ambientais e doenças neurodegenerativas .
Pesquisadores seguem analisando dados e buscando evidências que possam confirmar a conexão entre a ELA e o consumo de cogumelos tóxicos .