Atrasados, hospitais de campanha no Rio aguardam equipamentos e profissionais

Governo esbarrou na dificuldade em garantir medicos e respiradores para cumprir o prazo inicial de abertura das unidades até o final de abril

Foto: Agência Brasil
Respiradores

RIO — Com o sistema de saúde colapsado, a esperança do Rio está nos hospitais de campanha a serem inaugurados. Segundo o secretário de saúde, Edmar Santos, serão cerca de 3.400 leitos extras, sendo 2.000 de iniciativa do governo estadual e os demais de prefeituras ou governo federal.

A promessa inicial, porém, de inaugurações até o final de abril não será cumprida por causa da dificuldade em se adquirir equipamentos, especialmente respiradores, e de contratar profissionais de saúde suficientes. Por isso, o secretário prometeu que ao menos seis dos nove hospitais de campanha do estado ficarão prontos nos próximos 15 dias.

— Vamos abrir Maracanã, São Gonçalo, Nova Iguaçu, Jacarepaguá, Caxias e terminar Leblon nos próximos 15 dias. Os outros três (Casimiro de Abreu, Campos e Friburgo) vão demorar um pouco mais. Estamos no limite do colapso. Mais na frente, vamos precisar de mais leitos, mas já chegamos no teto. A base de infectados é muito grande, supera nossa capacidade. Mesmo se construir mais, não há profissionais ou equipamentos suficientes — afirmou o secretário estadual de Saúde Edmar Santos, que estima até 140 mil infectados no Rio nos números reais, ao RJTV de quarta. — Quando a curva fica descontrolada é impossível o sistema acompanhar. Nas próximas semanas a necessidade deve ser muito maior que a capacidade de atendimento.

As estruturas de grande parte dessas unidades já estão prontas. Mas, o problema é o vazio em seus interiores. Atualmente, a contratação de médicos e aquisição de respiradores são os grandes desafios não só do Rio, mas em quase todo o país. Dos nove hospitais de campanha do estado, apenas o do Leblon, em parceria com a Rede D'or, foi inaugurado, mas ainda com operação bem abaixo do prometido.

De 200 leitos, sendo 100 em UTIs apenas 30 conseguiram ser abertos. Pelo cronograma, a próxima inauguração seria o Maracanã, com 320 leitos de enfermaria e 80 de UTI, o segundo maior dos hospitais de campanha do estado, atrás apenas do de Nova Iguaçu, cuja estrutura para 500 leitos já está totalmente pronta há quase duas semanas, mas ainda sem sinais de operação.

— As obras estão em bom andamento, mas tem profissional? Respirador? Não nos dão essa informação. É o nosso receio — destacou o médico Carlos Vasconcelos, diretor do Sindicato de Médicos do Rio (SinMed Rio). — Um indício óbvio da dificuldade na contratação de médicos é a prorrogação frequente dos prazos dos editais. Médicos e fisioterapeutas respiratórios estão sendo os profissionais de saúde mais desejados. Há muita gente com insegurança por causa da falta de Equipamentos de Proteção Individual, e também temos pouca oferta de intensivistas com experiência. Essa dificuldade não foi só no Rio. Vimos a Itália fazendo contratações na América Latina, oferecendo R$ 50 mil de salário para anestesista, com garantia de visto de trabalho. Os EUA também ofereceram green card para médicos.

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Além dos dois mil leitos dos hospitais de campanha do estado, há outros 1.400 em ações de prefeituras e governo federal. A prefeitura do Rio, por exemplo, construiu seu hospital de campanha no Riocentro, que já está pronto, mas com data de inauguração sendo seguidamente adiado. O obstáculo é, mais uma vez, a falta de profissionais e de equipamentos. O edital de contratação da Rio Saúde, empresa pública do município, prevê a contratação de 1.049 médicos para atuarem no Riocentro, Hospital municipal Ronaldo Gazzolla, e nos federais Hospital Geral de Bonsucesso e Universitário Clementino Fraga, do Fundão. As contratações para os dois últimos foram fruto de um acordo com o Ministério da Saúde. A prefeitura está oferecendo salários de até R$15 e auxílio moradia, mas ainda não conseguiu preencher as vagas.

As contratações do estado estão mais dificultadas, segundo médicos, porque a oferta é de contrato para Pessoa Jurídica, o que garante menos benefícios trabalhistas, como afastamento remunerado em caso de contágio. Essas seleções estão sendo comandadas pela Organização Social Instituto de Atenção Básica e Avançada de Saúde (IABAS), escolhida para gerir sete de nove dos hospitais de campanha (os outros dois são em parceria do governo com a Rede D'or) num contrato de R$835 milhões pela construção e administração das unidades.

— Me parece que vai ser difícil conseguirem a viabilização de toda a mão de obra necessária — afirmou o pesquisador do Instituto de Estudos de Saúde Coletiva (Iecs) da Ufrj Leonardo Mattos. — A questão da terceirização, com menos direitos garantidos, afasta os profissionais. A possibilidade por enquanto é que os médicos da rede aumentem sua jornada. Podemos até buscar médicos em outros estados, mas não é só o Rio que está com dificuldades. Todos estados querem esses profissionais.

Em relação à dificuldade de respiradores, cujo fornecimento é um desafio mundial, Mattos acrescentou mais um obstáculo para o Rio: a briga política entre o presidente Jair Bolsonaro e o governador Wilson Witzel.

— O Rio está isolado politicamente. Não sabemos quantos respiradores o Ministério da Saúde vai distribuir para o Rio, mas não parece que vamos ter muita ajuda federal.

Procurada, a Secretaria estadual de Saúde não respondeu sobre a quantidade de respiradores e de profissionais que já está garantida, tampouco as datas exatas de inauguração dos hospitais de campanha.