Bolsonaro em cerimônia de abertura do ano legislativo
O Antagonista
Bolsonaro em cerimônia de abertura do ano legislativo


Desde a última segunda-feira (1) o Congresso tem novos presidentes: Arhur Lira (PP-AL) foi eleito na Câmara dos Deputados, e Rodrigo Pachego (DEM-MG) no Senado. Ambos são representantes do chamado centrão e apoiados pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

Ameaçado pela queda de popularidade, pela gestão problemática da pandemia e pelos 69 pedidos de impeachment protocolados no Congresso, os pleitos no legislativo são considerados decisivos para a continuidade do governo do presidente da República.

Mostra disso é que, para garantir a vitória dos parlamentares, Bolsonaro desembolsou R$ 630 milhões em emendas parlamentares  e prometeu cargos em ministérios que devem ser entregues nos próximos meses.

Mas, conforme explica Leandro Consentino, cientista político e professor do Insper, o alinhamento pautado no "toma lá, da cá" deve custar caro para o presidente da República.

"Certamente Bolsonaro fica refém dessas promessas. É errôneo imaginar que nessa relação quem manda é o Bolsonaro. Na verdade, quem tem um poder muito maior de decisão agora é o centrão. O presidente está nas mãos dos parlamentares para pautar sua agenda; seja reformas, seja pautas de costumes, ou, também, aquilo que ele não quer que seja pautado, como investigações sobre seus aliados, seu filho e sobre sua atuação na pandemia", explica o cientista político.

Já Sérgio Praça, cientista político da FGV-SP, enxerga a aliança mais como uma via de mãos duplas. Segundo ele, o alinhamento será "um processo bastante dinâmico e incerto". "Essas promessas de cargos, ministérios e liberação de verbas vão ser concretizadas ao longo do tempo, a conta-gotas, para que o centrão avalie se o presidente está cumprindo o combinado, e para o presidente avaliar se o centrão está cumprindo o combinado também".

Reforma Ministerial

Como parte do acordo, Bolsonaro certamente terá que promover mudanças em seus ministérios para alocar políticos de sua base aliada. A estratégia do Planalto, porém, é fazer isso a "conta-gotas". São dois os principais motivos: minimizar o risco de sofrer traições em votações de projetos, e evitar que partidos do centrão exijam mais espaço no primeiro e segundo escalões em um futuro próximo, obrigando Bolsonaro a entregar mais cargos do que o pretendido inicialmente.

Em um primeiro momento, Bolsonaro sinalizou estar disposto a trocar o comando de apenas duas pastas: Cidadania, ocupada hoje por Onix Lorenzoni, e Desenvolvimento Regional, comandado por Rogério Marinho.

"Cidadania e Desenvolvimento Regional são um bom ponto de partida, principalmente porque Desenvolvimento Regional tem um grande potencial para ser importante ano que vem, já que questões ligadas a infraestrutura e pequenas obras são importantes eleitoralmente. O da Cidadania é um ministério com uma visibilidade relativamente alta e tem o controle do bolsa-família, então pode ser interessante. Mas isso não segura o centrão por todo o tempo, é apenas um bom começo", analisa Sérgio Praça.

Para Consentino, a estratégia é inteligente por parte do Planalto, mas deve ser bem combinada com os parlamentares. "O custo de adotar essa estratégia é não parecer crível a quem você prometeu", afirma.

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O professor do Insper acredita que mais para frente Bolsonaro passará a ser pressionado pelo centrão a exonerar chefes de ministérios mais badalados, como o das Relações Exteriores, Saúde e Meio Ambiente.

"Bolsonaro já sofre pressão por parte da opinião pública e da sociedade civil para exonerar esses ministros, mas há duas questões essenciais. A primeira é uma identidade ideológica. A segunda, uma certa vontade de Bolsonaro de não expor fragilidades; por vezes ele já exonerou membros do governo apenas um tempo depois do que foi apontado pela imprensa. Mas, agora, a pressão aumenta porque teremos uma terceira força: a força de quem quer ocupar esses ministérios."

Pautas de costumes

Presidente afirmou que editará na próxima semana três decretos sobre facilitação de armas
Reprodução
Presidente afirmou que editará na próxima semana três decretos sobre facilitação de armas



Uma das prioridades de Bolsonaro é enfim conseguir aprovar as chamadas pautas de costumes, tão caras à parcela ideológica de seus eleitores. No documento de projetos prioritários entregue por Bolsonaro aos presidentes da Câmara e do Senado , Bolsonaro incluiu as seguintes propostas:

  • Simplificação e ampliação do registro, posse e venda de armas no país;
  • excludente de ilicitude -que suaviza as penalidades de militares e outras forças de segurança em casos de homicídio durante operações;
  • a inclusão de pedofilia como crime hediondo e aumento de pena de abuso sexual contra menores de idade;
  • alteração do estatuto do índio para incluir infanticídio como crime.


Segundo Sérgio Praça, ainda que Lira já tenha sinalidado a intenção de analisar tais pautas, esse é o ponto mais incerto do acordo, já que as medidas contam com ampla crítica negativa por parte da sociedade civil e de boa parte dos parlamentares.

Já Leandro Consentino, vê a questão como mais uma moeda de troca. "As pautas de costumes podem sair do papel, mas terão um preço elevado. É o preço de você estar sempre atendendo a acordos no varejo. Cada votação que você tem que levar a cabo, você tem uma moeda de troca.

Impeachment e chances para 2022

Para Sergio Praça, com Lira e Pacheco no comando das Casas,  a aceitação de um pedido de impeachment será "muito improvável". "Bolsonaro já fez o suficiente para justificar a abertura de não um só pedido, mas de vários. Se Bolsonaro trair o centrão, não cumprir o que foi prometido, isso pode estimular Lira a abrir um processo. Mas é improvável", acredita.

Já para Leandro Consentino, um processo de impeachment pode ser aberto caso haja uma pressão social tão grande que possa comprometer a própria reeleição dos parlamentares que compõem as Casas.

"O centrão é um grupamento que a ele não interessa ideologia, mas sim os próprios recursos de poder para se perpetuar cada vez mais no cargo. O que faria Lira abrir um processo de impeachment é perceber que esses recursos de poder estão se esvaindo, ou seja, se houver uma pressão social e da opinião pública tão forte que contamine os parlamentares."

Caso o casamento com o centrão dê certo, Consentino crê que Bolsonaro se fortalece para disputar a reeleição em 2022. "Ganha capilaridade, uma ampla aliança de partidos nos estados e municípios. Mas, claro, terá o ônus de ter que explicar o porquê de ter ter recorrido às estratégias da "velha política" que tanto criticou em sua campanha para o primeiro pleito".

Sergio Praça acredita que, como o apoio do centrão abre caminho para a aprovação de reformas ainda esse ano, a candidatura de Bolsonaro se fortalece para 2022 já que aumenta bastante sua base de apoio no mercado e no parlamento.

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