O acordo de delação premiada assinado por 77 acionistas e executivos da empreiteira Odebrecht e pela Procuradoria-Geral da República, em janeiro deste ano, é o maior já realizado no País e já começa a causar polêmica entre advogados que tiveram acesso ao documento, que ainda está sob sigilo.
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Segundo os papéis, os delatores da Odebrecht
deverão cumprir as penas definidas no acordo tão logo seja feita a homologação, efetivada no dia 30 de janeiro pela presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia. Contudo, dos 77 que assinaram a colaboração, apenas cinco já foram condenados pela Justiça. De modo que pelo menos 72 deles devem cumprir pena sem que esta tenha sido efetivamente sentenciada por um juiz.
Isso significa, portanto, que os executivos e acionistas da empreiteira vão ser submetidos a penas de prisão domiciliar sem que tenham sido formalmente investigados ou denunciados.
O trecho polêmico levantou discussão entre os advogados, sendo que alguns apontam o documento como sendo “desobediente à lei”. À Folha, o professor de direito processual penal da Faculdade de Direito da USP, Gustavo Badaró, disse que “a lei 12.850, que regula a delação premiada, determina que haja três fases em um acordo. A primeira é a negociação. Depois, a homologação por um juiz. E, então, a sentença que será aplicada observando os benefícios negociados”.
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Ainda segundo Badaró, no caso deste acordo da empreiteira, algumas pessoas que não foram investigadas irão cumprir pena “sem inquérito, sem denúncia e sem sentença”. Ele ainda diz considerar o documento como algo “chocante”. Também foi apontada a inconsistência no acordo, o que pode provocar problemas futuros: aliás, alguns dos advogados dos delatores afirmaram ao jornal que ainda não têm “ideia do que vai acontecer quando chegar a hora de cumprir pena e o caso for para os juízes de execução”, uma vez que estes magistrados podem recusar a aceitar os termos assinados.
O documento teria sido assinado por interesse dos executivos e da empresa para que a “questão fosse finalizada logo”. Um dos advogados dos delatores, em anonimato, ainda confirmou ao jornal que “estava claro que a lei estava sendo desrespeitada”, mas que ninguém questionou os procuradores sobre esses pontos. Voluntária, a assinatura de colaboração premiada foi atestada por juízes do STF.
Por outro lado, alguns especialistas defendem que seja “natural que a prática forense avance em relação à lei que regula a delação, que é recente”, sendo um processo fora do comum, portanto.
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Procurada pela reportagem da "Folha", a presidência do Supremo Tribunal Federal informou que a ministra Cármén Lúcia homologou as 77 delações com base no trabalho dos juízes auxiliares do ex-ministro Teori Zavascki, então responsável pela Lava Jato no STF. Depois disso, o material foi encaminhado à PGR, que afirmou não se manifestar sobre o caso, já que o processo está em sigilo. A Odebrecht não comentou.