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Projeto patrocinado principalmente por judeus dos EUA leva profissionais de todo o mundo para retratar vida no Oriente Médio

A imagem é ao mesmo tempo idílica e cuidadosamente encenada: quase uma dezena de fotógrafos estrangeiros, alguns deles celebrados no cenário artístico internacional, posando para um retrato coletivo em uma ensolarada manhã de novembro diante de uma surpreendente piscina verde no exuberante Parque Nacional Gan Hashlosha, no norte de Israel.

Alguns dos artistas estavam molhados depois de dar um mergulho nas águas do parque, popularmente conhecido por seu nome árabe, Sahne, que significa quente. A mesa estava posta para um piquenique simples, com pão pita, húmus e azeitonas.

Fotógrafa americana Rosalind Solomon tira foto em parque de Israel
NYT
Fotógrafa americana Rosalind Solomon tira foto em parque de Israel

"A maioria desses artistas não trabalha em grupos", disse Jeff Rosenheim, curador de fotografias do Museu Metropolitan de Nova York, observando a cena. "Mas aqui eles estão sentados na grama e batendo papo."

Os participantes fazem parte de um projeto concebido e dirigido por Frederic Brenner, um fotógrafo francês. Ele convidou 11 fotógrafos aclamados, incluindo Jeff Wall, do Canadá, e Thomas Struth, da Alemanha, para passar seis meses explorando o país para criar um corpo de trabalho que possa reformular o debate sobre Israel.

Brenner já passou 25 anos documentando a vida judaica em todo o mundo para "Diáspora", seu livro e exposição. Mas após as convulsões violentas da segunda Intifada, que explodiu em 2000 e durou anos, ele ficou "muito triste em ver como Israel estava sendo retratado", disse ele. "Nós estávamos em um paradigma binário - a favor e contra, vítima e agressor. Havia uma falta de complexidade na descrição deste lugar."

O novo projeto era um risco, que não pode retratar Israel em um ângulo mais suave. Muitos dos artistas se aproximaram com cautela, com medo do que eles chamaram de um projeto possivelmente "instrumentalizado" ou usado para fins políticos. O trabalho ainda está em andamento, mas o resultado deve ser tão desafiador e preocupante para muitos quanto é curativo para os outros.

Uma fonte de preocupação foram os patrocinadores. Brenner arrecadou US$ 3,5 milhões de um consórcio de mais de 60 doadores quase exclusivamente judeus e fundações dos Estados Unidos e Europa, mas o que os artistas criarem depende unicamente deles e não há garantia de que as imagens irão ajudar a suavizar a desgastada imagem de Israel. Ao contrário, elas podem consolidá-la ainda mais.

"Não gosto da ideia de alguém pensar que eu vim aqui para defender um lado", disse o fotógrafo Fazal Sheikh, conhecido por seu trabalho com povos deslocados da Ásia, América do Sul e África Oriental. Por outro lado, ele acrescentou, "também se trata de um convite muito generoso."

Para alguns, essa foi a primeira vez em Israel. A maioria veio com uma aguda consciência sobre o conflito israelense-palestino, ainda que vinda apenas das manchetes de jornais. Vários disseram achar difícil simplesmente estar no país.

Josef Koudelka, fotógrafo checo que registrou a invasão soviética de Praga em 1968, foi fotografar o muro alto de concreto que compõe a barreira oeste de Jerusalém. Embora ele não seja uma pessoa politizada, disse: "Não é fácil para mim estar neste país. Não vejo coisas que me deixam muito alegre."

Ele disse estar se concentrando no "crime contra a paisagem, na paisagem mais sagrada para a humanidade."

Uma fotógrafa dos Estados Unidos, Rosalind Solomon, a mais velha do grupo aos 81 anos, começou a fotografar retratos na cidade de Jenin, na Cisjordânia. Ela estava a poucos minutos de distância quando Juliano Mer Khamis, um famoso ator e diretor de teatro israelense-palestino, foi morto a tiros por um palestino mascarado em um acampamento de refugiados da cidade em abril.

"Sinto apenas a turbulência", disse ela. "Acho que em ambos os lados as pessoas são muito afetadas pelo clima em que estão vivendo.”

Sheikh disse estar concentrado no tema "apagamento", rastreando as memórias de palestinos em campos de refugiados da Cisjordânia e da essência das aldeias evacuadas.

Gilles Peress, o renomado fotógrafo francês que cobriu muitas zonas de conflito, está se concentrando em três ou quatro ruas no volátil e simbólico bairro de Silwan, em Jerusalém, cobiçado pelos palestinos por causa de sua proximidade com a Al Aksa, e agora pelos colonos judeus por estar sobre as ruínas do que muitos acreditam ser a antiga cidade de David.

Cada um veio por razões diferentes. Struth, nascido na década após a Segunda Guerra Mundial, disse que seu pai havia sido "ferido duas vezes no exército nazista", e que ele foi para Israel, em parte, "para aceitar a história do país”.

Wall disse que foi a Israel penas para fazer arte e por ter sido convidado. "N ão estou aqui para ajudar alguém a resolver questões", afirmou.

Ele disse que não busca por imagens, porque as pessoas podem olhar apenas para as coisas que já conhecem. Ele encontrou seu tema, que diz apenas ter a ver com a colheita da azeitona, por "pura coincidência".

O diverso grupo também inclui Wendy Ewald, um artista conceitual e educador americano; Martin Kollar da Eslováquia; Jungjin Lee da Coreia do Sul; Stephen Shore de Nova York; e Nick Waplington, um britânico que tem registrado a vida dos colonos israelenses. Os fotógrafos percorreram do deserto de Neguev até o famoso Instituto de Ciência Weizmann.

Brenner tem explorado o tema da soberania versus a identidade portátil. "Há tantos sentimentos feridos neste país, tanta raiva", disse ele. "E, ao mesmo tempo, há tanto 'chesed'", hebraico para benevolência ou bondade.

A Academia de Artes e Design de Bezalel ofereceu assistentes locais a cada fotógrafo e quase todos trabalham com filme oferecido pela Kodak. Vários dos fotógrafos lecionaram aulas na academia - cerca de mil pessoas participaram das palestras de Wall, que foram gravadas e, em seguida, exibidas quatro vezes. Mishkenot Sha'ananim, um centro cultural e de conferência em Jerusalém, abriu as suas instalações para o projeto.

A obra toda será revelada em cerca de dois anos em uma exposição itinerante, um catálogo de todo o trabalho dos artistas e um trabalho digital. A partir do final de 2012, os artistas começarão a divulgar suas próprias monografias. Rosenheim, do Metropolitan, é consultor de curadoria do projeto.

Alguns dos fotógrafos se questionam o que os patrocinadores judeus pensarão do resultado. Brenner disse que não ficaria decepcionado e que escolheu fotógrafos que seriam compassivos, não complacentes. Este, segundo ele, é "o local de disparidades radicais e uma dissonância insuportável. Mas há beleza na dissonância".

Usando frases bíblicas de quando Moisés enviou uma dezena de espiões para explorar a terra prometida, Brenner acrescentou: "Eu não trouxe as pessoas aqui para ver a terra de leite e mel. Eu s trouxe aqui para ver a terra que devora os seus habitantes. "

Por Isabel Kershner