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Educadora afirma que intenção da obra é deixar o aluno acostumado com linguagem popular à vontade e não "ensinar errado"

Uma das autoras do livro didático de língua portuguesa Por uma vida melhor , da coleção Viver, aprender, adotado pelo Ministério da Educação (MEC) para a Educação de Jovens e Adultos (EJA), nega que a obra ensine o aluno a usar a norma popular da língua. Nota da coluna Poder Online publicada na manhã desta quinta-feira mostra que o livro ensina aos alunos que é válido usar expressões, como “nós pega o peixe” ou “os menino pega o peixe” .

Para a autora Heloisa Ramos, apesar de ter um capítulo dedicado ao uso da norma popular, o livro não está promovendo o ensino dessa maneira de falar e escrever. “Esse capítulo é mais de introdução do que de ensino. Para que ensinar o que todo mundo já sabe?”.

Segundo Heloisa, que é professora aposentada da rede pública de São Paulo e dá cursos de formação para professores, a proposta da obra é que se aceite dentro da sala de aula todo tipo de linguagem, ao invés de reprimir aqueles que usam a linguagem popular.

“Não queremos ensinar errado, mas deixar claro que cada linguagem é adequada para uma situação. Por exemplo, na hora de estar com os colegas, o estudante fala como prefere, mas quando vai fazer uma apresentação, ele precisa falar com mais formalidade. Só que esse domínio não se dá do dia para a noite, então a escola tem que ter currículo que ensine de forma gradual”, diz.

Livro usado na Educação de Jovens Adultos tem capítulo sobre a norma popular da língua
Reprodução
Livro usado na Educação de Jovens Adultos tem capítulo sobre a norma popular da língua
De acordo com a professora, o livro didático adotado pelo MEC para turmas do Ensino de Jovens e Adultos (EJA) foi elaborado por ela e por outros especialistas em língua portuguesa com base nas experiências que tiveram em sala de aula após décadas de ensino. “Nossa coleção é seria, temos formação sólida e não estamos brincando. Não há irresponsabilidade da nossa parte”, afirma.

Ela acredita que, ao deixar claro que é tolerado todo tipo de linguagem, a escola contribui para a socialização e melhor aprendizado do estudante. “Quem está fora da escola há muito tempo é quieto, calado e tem medo de falar errado. Então colocamos essa passagem para que ele possa sair da escola com competência ampliada”, diz.

Em nota enviada ao iG , o MEC defendeu o sudo do livro e afirmou que o papel da escola não só o de ensinar a forma culta da língua, mas também o de combater o preconceito contra os alunos que falam linguagem popular.

Apesar de defender que o livro continue sendo adotado, a autora admite que é preciso que o professores entendam a proposta para não desvirtuar o que ele propõe. O material vai acompanhado de um livro guia ao professor e os parâmetros curriculares do MEC explicam a abordagem variada da língua, mas como os livros são distribuídos para escolas de todo o país, é difícil ter esse controle.

Linguagem popular divide especialistas

A doutora em linguística e professora da Universidade de Brasília (UnB), Viviane Ramalho, vai além da opinião da autora do livro e defende que a linguagem popular seja ensinada abertamente nas escolas. “O ideal seria aprender todas as possibilidades diferentes até mesmo para respeitar o interlocutor que usa outra variedade linguística”, diz.

Para ela, essa seria uma forma da escola se aproximar da realidade dos estudantes. “Há uma exigência da própria sociedade de que o individuo saiba usar a as diversas variedades da língua”.

A linguista Juliana Dias acredita que a escola deva ensinar exclusivamente a norma culta e usar a linguagem popular apenas como exemplo durante as explicações. “O popular não cabe para o ensino. Cabe somente para reflexão, discussão, e até para o combate ao preconceito com as formas mais simples de se falar”.

Veja reprodução de trecho do livro "Por uma vida melhor":