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O céu que nós vemos não é o limite. Um foguete o furou…

…E no domingo de 20 de julho de 1969, há meio século portanto, a humanidade realizava a sua mais incrível e extraordinária aventura, inimaginável, até então, fora das extravagantes obras de ficção científica: a conquista da lua!

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No espaço exíguo da cápsula, a ausência de aparelhos eletrônicos obrigava a checagens constantes e anotações escritas
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No espaço exíguo da cápsula, a ausência de aparelhos eletrônicos obrigava a checagens constantes e anotações escritas

Após uma viagem de ida de impressionantes 102 horas e 45 minutos cobrindo cerca de 380 mil quilômetros, eram 20 horas, 17 minutos e 40 segundos (horário universal de Greenwich) quando o módulo lunar americano Eagle, nome dado em homenagem à Águia que simboliza os EUA, pousou em segurança na superfície lunar.

Aqui na Terra, pela primeira vez em sua história, estima-se que 400 milhões de pessoas, de pelo menos 39 países, se postavam diante de seus televisores, ávidas pela mesma imagem: a transmissão ao vivo desse grandioso feito. Dois astronautas iriam caminhar na Lua , o homem superava o próprio homem e uma sensação preenchia inteiramente a espécie humana: se tudo desse certo, nada mais lhe parecia ser impossível. Assim, era inevitável e justificável a rede irmanada de sentimento de onipotência. Significava que nós, terráqueos, éramos mais poderosos — muito mais poderosos — do que imaginávamos, a ponto de uma nova expressão ser incorporada aos mais diversos idiomas: alunissar.

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O pioneiro módulo lunar Eagle fazia parte da missão espacial americana denominada Apollo. Tratava-se agora da Apollo 11 , e era tudo ou nada. Era viver ou morrer. E, na segunda hipótese, morrer de inanição, medo, pânico, frio ou calor numa temperatura que oscila entre 100 graus negativos e positivos — era morrer no poeirento e pedregoso e pleno de crateras e inóspito satélite natural. Era morrer na mais profunda solidão.

O risco se fazia tão real que o presidente americano à época, Richard Nixon , já tinha pronto um discurso para tal eventualidade, no qual ele se remetia ao poema “The Soldier”, composto por Rupert Brooke na Primeira Guerra Mundial. Os astronautas não sabiam disso e, mesmo na Casa Branca, além de Nixon, não mais que três assessores tinham conhecimento desse texto. Também um clérigo fora informado, ele louvaria “as almas ao mais profundo do profundo”.

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Solitário como Adão

No módulo Eagle, que pousou na Lua, estavam os astronautas Neil Armstrong , 38 anos e comandante da missão, e Edwin “Buzz” Aldrin, 39 anos, responsável por pilotá-lo. Em outro módulo, de comando e serviço, batizado de Columbia em referência a uma das obras de Julio Verne, permaneceu o astronauta Michael Collins, 38 anos. Sua função foi a de ficar orbitando a Lua enquanto seus dois companheiros exploravam o solo lunar, para depois, e no momento rigorosamente previsto, resgatá-los e trazê-los de volta ao aconchego da Terra.

Nas 21 horas e 30 minutos que se manteve orbitando, Collins se sentiu, conforme declarou posteriormente, “o mais solitário dos seres, mais solitário que Adão”. Esses dois módulos foram levados ao espaço pelo foguete Saturno V, lançado no Centro Espacial Kennedy, na Flórida, no dia 16 de julho de 1969 — foi ele, como se disse, que furou o céu e nos deu a perspectiva de que no Universo não existem fronteiras. No momento de seu lançamento, calcula-se que uma multidão de 500 mil pessoas se posicionara ao longo dos acostamentos da rodovia Route 1. Nos aparelhos de rádio, “Fly Me to the Moon”, com Frank Sinatra, tocava sem parar.


Quando se aproximava o momento da alunissagem, houve problemas. Nem Armstrong nem Aldrin entraram em pânico — eram homens frios, ousados, perfeitamente treinados e com excessivo conhecimento técnico. A pouco menos de 2 quilômetros da superfície, o soar de alarmes deixou em polvorosa o controle da missão em terra, no Texas. O alívio veio logo. Fora somente uma pane no sistema e a descida prosseguiu, agora com Armstrong e Aldrin tendo de improvisar manobras para não se espatifarem contra rochas.

O pouso histórico acabou acontecendo com um erro de 5 quilômetros em relação ao ponto programado, na região lunar chamada “Mar da Tranquilidade” e, nos tanques, já não havia mais do que 25 segundos de combustível. Às 2 horas, 39 minutos e 33 segundos a escotilha do Eagle foi aberta. Às 2 horas e 51 minutos, com seus batimentos cardíacos bem acelerados, Armstrong começou a descer os nove degraus do módulo para tocar o solo — ou seja, o homem pisou mesmo na Lua na madrugada da segunda-feira, 21 de julho.

Passaram-se 20 minutos, e agora era Aldrin quem descia. A primeira providência do comandante Armstrong foi recolher uma rocha e guardá-la no bolso da perna direita do traje, precavendo-se, dessa forma, para a eventualidade de eles terem de retornar antes do programado — estava, assim, garantida para a Terra, pelo menos uma amostra do chão de seu romântico e prateado satélite. “É um pequeno passo para um homem, um salto para a humanidade”, foi a mensagem que Armstrong eternizou para o mundo — a baixa gravidade e a ausência de atmosfera faziam com que eles saltassem, uma vez que, nessas condições, os pés não se fixam no solo.

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Aldrin informou, logo após descer do Eagle, que toda a paisagem era “uma magnífica desolação”. Uma máquina fotográfica automática Hasselblad, acoplada ao módulo, tirou dele uma foto, e na viseira de seu capacete aparece refletida a imagem de Armstrong — esse reflexo, infelizmente, foi usado pelos muito céticos e muito ignorantes como argumento de que os americanos haviam montado uma farsa sobre o pouso na Lua. Os dois astronautas, emocionados, fixaram uma bandeira dos EUA, mas não conseguiram aprofundar o mastro mais que 5 centímetros.

Por meio de uma transmissão de rádio-telefone, nesse momento Richard Nixon enviou-lhes uma mensagem: “Alô, Neil e Buzz. Estou falando (…) da Sala Oval da Casa Branca. E esse certamente deve ser o telefonema mais histórico já feito (…)”. Armstrog e Aldrin passaram 2 horas e 15 minutos fora do Eagle e coletaram 21,5 quilos de material lunar. Voltaram ao módulo e nele ficaram por 21 horas e 30 minutos, quando foram então resgatados por Collins — o Eagle restou abandonado na órbita da Lua, e certo dia desapareceu, vencido pelo tempo. Enquanto partiam, Aldrin viu cair a bandeira que anteriormente só tremulara quando ele mexera em seu mastro. Na Lua não venta.

Corrida espacial na “guerra fria”

Depois de lançar o módulo de pouso com Armstrong e Aldrin, Michael Collins permaneceu quase 24 horas sozinho
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Depois de lançar o módulo de pouso com Armstrong e Aldrin, Michael Collins permaneceu quase 24 horas sozinho

Enquanto os três heróis agora viajam de retorno à Terra e antes de contarmos sobre a sua chegada, vale observar o momento político em que a missão ocorreu. EUA e ex-União das Repúblicas Socialistas Soviéticas disputavam geopoliticamente o controle de países e regiões em todos os continentes, decorrência da formação de um bloco comunista e outro capitalista ao final da II Guerra Mundial — era a chamada “Guerra Fria”.

Nesse contexto se dá a fundação da NASA , em 1958, e a sua missão, em troca de bilhões de dólares (a missão Apollo 11 custou US$ 200 bilhões), era a conquista do espaço. Mais: nesse processo, a NASA teria também de desenvolver tecnologicamente objetos úteis para o dia a dia dos americanos. A rigor, uma coisa casa com a outra, e isso não é difícil de ser demonstrado. O leitor ou a leitora já usaram um GPS numa viagem, por exemplo, de 380 quilômetros? Se o fizeram, a existência de tal aparelho só foi possivel porque alguém viajou esses 380 quilômetros multiplicados por mil para ir à Lua. Já utilizaram aspirador de pó portátil? Novamente, viva a ida ao nosso satélite.

Após a reentrada na atmosfera, a cápsula de comando Columbia com os tripulantes pousa no Pacífico, onde é resgatada
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Após a reentrada na atmosfera, a cápsula de comando Columbia com os tripulantes pousa no Pacífico, onde é resgatada

A corrida espacial entre URSS e EUA fazia parte da “Guerra Fria”, e diversas Apollo foram lançadas (a primeira tripulada foi a 7). A Apollo 10 chegou a 15 quilômetros da Lua mas não alunissou — somente verificou se era possível realizar a acoplagem. Assim, pisar na superfície da Lua era a forma de desbancar a supremacia dos soviéticos que tinham colocado o primeiro homem em órbita da Terra: Yuri Gagarin , em 1961.

Até o ex-presidente americano John Kennedy telefonou-lhe e deu-lhe os parabéns, mas, mal o telefone foi desligado, ele educadamente determinou: “acredito que os EUA deveriam se comprometer a aterrissar um homem na Lua e retorná-lo em segurança para a Terra antes de a década acabar”.

quarentena
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O trio ficou isolado 21 dias em uma Instalação de Quarentena Móvel a bordo do porta-aviões Hornet: visita do presidente Richard Nixon

Assassinado em 1963, Kennedy infelizmente não pode ver que a a sua ordem foi rigorosamente cumprida.

Chegou a hora de voltarmos aos nossos astronautas que largamos, lá no alto, em seu retorno à Terra. No dia 24 de julho, às 16 horas e 50 minutos, o módulo Columbia amerrissou no Oceano Pacífico. Pouco antes de ele ser resgatado pelo porta-aviões USS Hornet haveria um último susto, porque começara a entrar água pela escotilha. Tudo foi sanado pelas equipes de mergulhadores escaladas para recolher do módulo Armstrong, Aldrin e Collins, e dali para frente só restava um período de quarentena (ficaram isolados pois ainda não se tinha certeza da não existência de vida bacteriana na Lua) e, depois, muitas homenagens e muitas celebrações.

Os três parceiros sempre estiveram conscientes dos riscos que corriam, e prova disso eram os 10 mil autógrafos que deixaram com a NASA a serem leiloados na hipótese de eles morrerem tão distantes do planeta — o dinheiro arrecado seria dado a seus familiares (hoje, um desses autógrafos vale cerca de 24 mil euros).

A celebração pela conquista foi exaustiva. Além dos desfiles nacionais, a equipe visitou 25 países entre 29 de setembro e 5 de novembro
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A celebração pela conquista foi exaustiva. Além dos desfiles nacionais, a equipe visitou 25 países entre 29 de setembro e 5 de novembro

Com o final da “Guerra Fria” a corrida espacial também desacelerou, demonstrando que a competição política não deixa de ser um eficiente braço propulsor do desenvolvimento tecnológico da humanidade — os programas da NASA seguem hoje em um ritmo normal, até porque já não existe a quem desafiar. “Se podíamos voar para a Lua, do que mais seríamos capazes?”, escreveu em “Pálido Ponto Azul” o conselheiro da NASA e astrônomo Carl Sagan, chefe dos projetos Mariner e Viking. A resposta está sendo dada quando já se fala em fazer o homem pousar em Marte, pelo menos até 2040, transportado pela nave Orion, trabalho que vem sendo desenvolvido conjuntamente pelos EUA e Europa. Uma coisa, no entanto, é certa: se a caminhada em solo marciano de fato acontecer, é porque um dia, há 50 anos, caminhamos na Lua .

Professor deu poucas entrevistas

NASA/Bill Ingalls

O primeiro homem a caminhar na Lua optou por uma vida discreta, sabendo que, dali em diante, nada poderia ser maior. Ao sair da Nasa, Neil Armstrong (1930-2012) foi lecionar engenharia espacial. Raramente deu entrevistas, evitou ser reconhecido e até processou o barbeiro que leiloou uma mecha de seu cabelo. Seu gesto mais expansivo foi deixar em solo lunar uma homenagem a sua filha Karen, falecida em 1962, aos 2 anos, vítima de câncer. Já idoso, viu-se questionado se acreditava em marcianos: “Nossos filhos na pré-escola serão os primeiros marcianos”.

Já a vida de seu colega Edwin “Buzz” Aldrin foi mais turbulenta. Ele sempre se ressentiu de ser o segundo homem. “Deveriam me apresentar como um membro da primeira equipe a pisar na Lua”, declarou. Um ano antes da Apollo, sua mãe havia cometido suicídio. Seu pai teve o mesmo destino. As perdas podem ter acelerado uma depressão que o levou ao alcoolismo. Presbiteriano, ele comungou em silêncio ao pousar na Lua e, desde o retorno, é um defensor da revitalização do programa espacial.

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Único a permanecer em órbita, Michael Collins atingiu o posto de general da Força Aérea, tornou-se assessor de Richard Nixon e professor em Harvard. Em sua autobiografia, o piloto descreve o seu papel discreto, mas fundamental: “Eu não era o ator principal, mas sem o qual os demais não poderiam deixar o palco”.

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