Operação se concentra em rios da região do Vale do Javari, no Amazonas, onde dupla está desaparecida desde domingo
Reprodução/Exército 7.6.2022
Operação se concentra em rios da região do Vale do Javari, no Amazonas, onde dupla está desaparecida desde domingo

A Polícia Federal investiga um esquema de lavagem de dinheiro para o narcotráfico por meio da venda de peixes e animais que pode estar relacionado ao desaparecimento do indigenista Bruno Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips, procurados desde domingo no entorno da Terra Indígena do Vale do Javari, no Amazonas. Apreensões de peixes que seriam usados no esquema foram feitas recentemente por Pereira, que acompanhava indígenas da Equipe de Vigilância da União dos Povos Indígenas do Javari (Unijava).

Pirarucus, tracajás e carnes de caça seriam vendidos na região de fronteira do Vale do Javari com o Peru. A PF já tem pistas de que o esquema está ligado ao desaparecimento de Pereira e de Phillips.

As apreensões feitas por Bruno e a Unijava em embarcações contrariaram o interesse do narcotraficante Rubens Villar Coelho, que apesar de conhecido como Colômbia, tem nacionalidade brasileira e peruana, segundo informações de pessoas que investigam o esquema. O narcotraficante usa a venda dos animais para lavar o dinheiro da droga produzida no Peru e na Colômbia, que fazem fronteira com a região do Vale do Javari, vendida a facções criminosas no Brasil.

As barcas levavam toneladas de pirarucus, peixe mais valioso no mercado local e exportado para vários países, e de tracajás, espécie de tartaruga considerada uma especiaria e oferecida em restaurante sofisticados dentro e fora do país.

As suspeitas da PF são de que Colômbia teria ordenado a Amarildo da Costa de Oliveira, o Pelado, colocar a “cabeça de Bruno a leilão”. Pelado foi preso na quarta-feira por porte de munição e de drogas, depois de denúncias de que estava envolvido no desaparecimento de Pereira e Phillips. Amarildo teve a prisão temporária decretada anteontem, na audiência de custódia, pela juíza Jacinta Silva dos Santos.

Facções estrangeiras

De acordo com pessoas próximas à investigação, que não quiseram se identificar, o esquema criminoso tem a participação de traficantes colombianos e de peruanos da maior facção criminosa do país vizinho. O grupo atuava com a ajuda de pescadores brasileiros nas comunidades de Ladário, São Gabriel e São Rafael, essa última visitada por Pereira e Phillips no domingo em que desapareceram. Eles haviam marcado um encontro com Churrasco, um líder comunitário que é tio de Pelado mas não foi ao compromisso.

Colômbia teria residência em Benjamim Constant e um depósito flutuante em Islândia, ilha em frente ao município. No depósito, armazenaria pescados e carnes cobiçadas de caça como porco queixada, anta e veado, e o combustível, que vem do Peru, para barcos de pesca. Moradores da região contam que armas de grosso calibre também são guardadas.

Churrasco trabalharia para Colômbia como “linha de frente” do crime organizado no Vale do Javari. Outros nomes informados por moradores locais e fontes que acompanham as investigações ao GLOBO são Nei, Caboclo e Jâneo, que foi ouvido pela Polícia Civil um dia depois do desaparecimento de Phillips. No mesmo dia, a polícia ouviu Churrasco. Apesar de considerados suspeitos de envolvimento no desaparecimento, como Amarildo, Jâneo e Churrasco foram liberados.

A última apreensão de pesca ilegal pela Univaja foi no dia 24 de março. A equipe recolheu um motor e uma embarcação de Jâneo onde estaria Colômbia, mas os dois foram liberados. A embarcação foi levada para um local próximo da prefeitura de Atalaia, mas foi resgatada durante a noite, na época.

Material orgânico

A Polícia Federal informou ontem ter encontrado “material orgânico aparentemente humano” no rio perto do porto de Atalaia do Norte, que faz parte da área em que se concentram as buscas a Pereira e Phillips. Mas o material ainda vai ser analisado pelo Instituto Nacional de Criminalística.

A PF acrescentou que já foi feita a coleta do material genético de referência do jornalista e do indigenista desaparecidos, colhido com parentes dos dois no Recife e em Salvador, cidade em que Phillips passou a morar no Brasil. O material será usado na comparação com amostras de sangue encontradas na lancha de Amarildo, recolhida pela Polícia Militar quando o pescador foi preso.

A Univaja informou que o embaixador do Peru no Brasil, Rómulo Acurio, pediu às autoridades do país vizinho para colaborar nas buscas.

A porta-voz do Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos, Ravina Shamdasani, disse ontem, em Genebra, que o governo brasileiro demorou para iniciar as buscas:

"Após decisão judicial, as autoridades empregaram mais meios para procurar esses dois homens. Mas inicialmente, a resposta das autoridades foi lenta."

Depois de ter classificado a viagem de Pereira e Phillips de aventura, em seu discurso na Cúpula das Américas, ontem, em Los Angeles, o presidente Jair Bolsonaro disse que as Forças Armadas e Policia Federal estão em “uma busca incansável”.

"O britânico Dom Phillips e o brasileiro Bruno Pereira desapareceram no Vale de Javari e, desde o primeiro momento, nossas Forças Armadas e a Polícia Federal estão em uma busca incansável. Pedimos a Deus para que sejam encontrados com vida", afirmou.

O ministro do STF Luís Roberto Barroso intimou ontem a União, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Anderson Torres, o diretor da Polícia Federal, Márcio Nunes, e o presidente da Funai, Marcelo Xavier, a dar esclarecimentos sobre o caso e apresentar em cinco dias um relatório de medidas tomadas para achar Pereira e Phillips, sob pena de multa diária de R$ 100 mil.

A Defensoria Pública da União pediu à Polícia Federal a criação de um gabinete de crise, com a participação de indígenas, para coordenar as buscas. O DPU também pediu a participação de ao menos um indígena em cada embarcação. Em nota, a PF disse que os pedidos da defensoria são impróprios.

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